Tetraplegismo

As paredes do quarto eram os limites do mundo dela. Os sons eram apenas Elton John na vitrola da irmã e os gritos esparsos do bem-te-vi na janela. O dia eram rabiscos feitos na vida que escorria na cadeira.
À noite, a alma dela acendia. O barulho da chave dele na fechadura trazia vida ao seu corpo. A boca recriava na sua o amor que lhe devolvia a ilusão de movimentos. Os olhos dela contavam-lhe das saudades. A voz dele trazia-lhe a vida lá de fora. O calor do corpo dele na cama ressuscitava-lhe a esperança. E ela voltava a acreditar nos seus sonhos.
Uma noite ele não voltou. O dia nunca mais nasceu. Nada lhe sobrou. Nem a opção de apagar as estrelas que, dentro da moldura da janela, teimavam em continuar brilhando.

E-mail da autora: